O primeiro disparo feito pela Rússia na guerra em território ucraniano não afetou apenas os habitantes daquele país, mas também o restante do mundo, incluindo o Brasil. O motivo? A Rússia é a maior fornecedora de fertilizantes à nossa agricultura e de boa parte do mundo.
Com as sanções econômicas que o país está enfrentando em virtude da invasão, como o bloqueio do sistema de transferências internacionais Swift, as exportações desses produtos ao Brasil e demais países correm o risco de serem suspensas.
Caso a Rússia fique impedida de exportar esses produtos, que são indispensáveis ao sucesso das lavouras, qual será o impacto econômico nos preços dos alimentos que consumimos?
Afinal, existe alternativa caso o Brasil não consiga adquirir e nem produzir a quantidade suficiente de fertilizantes com o fim de garantir a qualidade do solo agrícola e das pastagens? É o que iremos tratar neste artigo. Acompanhe!
Importância da produção de fertilizantes da Rússia
Com o propósito de entender o motivo de toda essa preocupação mundial, é preciso contextualizar o que representa a produção de fertilizantes da Rússia e a dependência do restante do mundo, incluindo o Brasil, desses produtos nas lavouras e pastagens.
O Brasil, como a maioria do mundo, depende das exportações de fertilizantes produzidos pela Rússia, que pode ser suspensa devido a guerra com a Ucrânia.
Rússia, Canadá, Belarus e China respondem por 80% da produção de cloreto de potássio do mundo. Desses, a Belarus (país vizinho da Rússia e aliado do governo de Vladimir Putin), também está impedida de exportar sua produção, mesmo não tendo entrado diretamente na guerra contra a Ucrânia.
Esse impedimento ocorre em virtude de um bloqueio ao deslocamento dos seus produtos, feito pela Lituânia, seu outro vizinho e contrária à invasão russa. Com isso, Belarus não consegue acesso ao mar, e consequentemente, não tem como garantir a exportação dos seus fertilizantes aos países compradores.
Essa crise mundial dos fertilizantes, devido a guerra, afeta diretamente o Brasil, uma vez que Rússia e Belarus respondem por 26% das importações de fertilizantes do nosso país. Por isso, essa situação está preocupando os agricultores.
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Exportação dos fertilizantes da Rússia ameaça a agricultura brasileira?
Conforme mostramos acima, grande parte do restante do mundo, mesmo sem envolvimento direto na guerra, se vê ameaçado devido às dificuldades de importar os fertilizantes da Rússia e da Belarus, insumos indispensáveis ao desenvolvimento agrícola.
Logicamente, vamos nos atentar ao que essa situação está causando diretamente aos agricultores do Brasil, e os possíveis desdobramentos. Para se ter uma ideia do que isso representa, só em 2021, o Brasil consumiu 40 milhões de toneladas de fertilizantes.
De acordo com a Embrapa Solos, o país precisa importar toda essa quantidade de insumos agrícolas porque o nosso solo, em sua maioria, é pobre em nutrientes, que precisam ser repostos com o propósito de garantir o sucesso das lavouras.
O solo brasileiro depende muito dos fertilizantes para suprir a falta de nutrientes indispensáveis às plantas.
O setor agrícola brasileiro importa mais de 85% das matérias-primas usadas na produção dos fertilizantes. No caso do potássio (K), por exemplo, a dependência externa alcança quase 100%.
Aliás, essa dependência externa vem aumentando nos últimos anos. Em 2017, por exemplo, as importações representavam 76% da demanda, segundo dados da Associação Nacional para Difusão de Adubos (Anda).
É preciso lembrar que o Brasil passou a ficar ainda mais dependente do mercado exterior depois que a Petrobrás saiu do setor de produção de fertilizantes, devido a crise financeira interna, causada pela operação Lava Jato. Com isso, os produtores rurais foram obrigados a aumentar as importações.
Somente nos dois últimos anos (2021 e 2020), a demanda brasileira por fertilizantes cresceu 26%. São dois motivos principais: acompanhando uma tendência mundial na compra desses insumos; e por causa das sucessivas safras recordes de grãos no país, que levaram os produtores a utilizar uma quantidade maior de fertilizantes.
Demanda brasileira por fertilizantes produzidos por outros países. Rússia é o maior exportador. Imagem: BBC.
Como a Rússia é um dos maiores fornecedores ao Brasil, a demanda pelos insumos russos também cresceu nesse mesmo período, só que em proporções ainda maiores. As nossas importações desse país praticamente dobraram apenas no último ano, passando de US$ 1,8 bilhão em 2020, para US$ 3,5 bilhões (R$ 18 bilhões) em 2021.
Aí, portanto, que entra o problema. O Brasil aumentou a utilização desses produtos vindos da Rússia e agora se vê num impasse ao ter suas compras ameaçadas pela guerra.
Outra questão importante é que quase toda a tecnologia disponível no país, voltada à produção e aumento de eficiência dos fertilizantes no campo, não é brasileira, o que aumenta ainda mais nossa dependência exterior.
Principais culturas que utilizam fertilizantes
Apenas as lavouras de soja, milho, cana-de-açúcar e algodão, cultivadas no Brasil, representam cerca de 90% do uso desses produtos. Assim sendo, é preciso levar em conta duas questões importantes, ao analisar a crise mundial causada entre a Rússia e a Ucrânia.
A primeira delas é que boa parte dos produtos que mais utilizam fertilizantes, que citamos acima, estão voltados à exportação. Assim, as dificuldades na compra de insumos prejudicaria o mercado interno e as vendas ao comércio exterior, o que poderia afetar o PIB brasileiro.
Lavouras, como de milho, dependem muito dos fertilizantes da Rússia e outros países para o sucesso na produtividade.
A segunda questão é que, por outro lado, alimentos que estão mais no “dia-a-dia do brasileiro”, como arroz e feijão, teoricamente não devem ser tão afetados com essa crise dos fertilizantes, ou seja, não deveriam sofrer elevações significativas de preços. Citamos “teoricamente” porque existem outros fatores envolvidos, além do risco de “especulações de mercado”.
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Produtores antecipam compras de fertilizantes
Um desses fatores, que podem influenciar desde já o preço dos alimentos (antes mesmo de uma eventual escassez dos fertilizantes), é o fato de que, preocupados com essa insegurança causada pela guerra, muitos produtores rurais brasileiros estão antecipando suas encomendas, pensando na próxima safra de verão.
O resultado é que, aumentando a demanda de compra, isso também provoca uma especulação sobre o valor do insumo.
No caso da soja, por exemplo, cujo próximo ciclo agrícola ocorre em setembro/outubro, os produtores estão bastante inseguros sobre o futuro, pois dependem dos fertilizantes para garantir a qualidade das lavouras.
O Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (MAPA) procura amenizar essa situação causada pela guerra da Rússia. Garante que o Brasil tem quantidade suficiente de fertilizantes com o fim de atender os agricultores que precisam desses insumos agora, como é o caso do milho safrinha e do trigo, cujo plantio ocorre em abril.
Porém, o futuro da agricultura brasileira e sua dependência de fertilizantes importados vai depender muito dos desdobramentos dessa crise militar e econômica internacional.
O Brasil tem como reduzir as importações de fertilizantes?
Antes da guerra entre a Rússia e Ucrânia, o Brasil já estava preocupado com essa dependência tamanha da importação de fertilizantes.
Outro fato importante e que preocupou muito toda a cadeia agrícola: entre 2008 e 2009 ocorreu outra crise internacional de fertilizantes e, como resultado, o preço desses insumos triplicou, o que elevou os custos dos alimentos.
A importação brasileira de fertilizantes da Rússia vem aumentando. Com as sanções econômicas fica o impasse. Imagem: BBC.
Uma das primeiras medidas a curto prazo seria importar uma quantidade maior de fertilizantes de outros países produtores, como China, Marrocos e Canadá.
Porém, segundo especialistas do setor, essa alternativa é a mesma que está sendo adotada por todos os países que dependiam das exportações da Rússia e Belarus. Portanto, será pouco provável que países fornecedores de fertilizantes, como o Canadá, consigam suprir essa nova demanda pela matéria-prima indispensável às lavouras.
No caso da China, segundo maior exportador ao Brasil, é uma questão de ter que pagar mais caro pelo produto. Isso porque os chineses usam o carvão para produzir nitrogênio, o que encarece demais o custo de produção.
Dessa maneira, uma maior importação chinesa vai custar mais caro ao agricultor brasileiro e, na última ponta, afetar os preços dos produtos consumidos pela população.
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E a produção brasileira de fertilizantes?
De olho no crescimento da demanda, devido a essa crise internacional, quem já produz fertilizantes no Brasil está se mobilizando e quer “abocanhar” parte dessa fatia de mercado.
É o caso da empresa mineira Verde Agritech, que está antecipando seus planos de investimentos em produção. Ela deve colocar em funcionamento sua segunda unidade de produção de fertilizantes potássicos no terceiro trimestre deste ano.
Essa nova unidade, localizada também em Minas Gerais, terá capacidade de produzir 1,2 milhão de toneladas/ano, ou seja, vai triplicar a produção em relação ao ano passado.
Contudo, mesmo com todo esse esforço dos empresários brasileiros, suprir a demanda atual é impraticável. Então, o que fazer? Confira a seguir.
Estratégia brasileira nessa crise mundial dos fertilizantes da Rússia
Buscando alternativas a essa nova crise mundial envolvendo fertilizantes, o governo federal lançou recentemente o Plano Nacional de Fertilizantes. O objetivo é, primordialmente, que esse plano seja uma referência de planejamento do setor de fertilizantes aos próximos 28 anos (até 2050).
Inclui todos os segmentos envolvidos nesse setor: indústria, produtores rurais, novas tecnologias, uso de insumos minerais, sustentabilidade ambiental, entre outros.
Preocupados, os agricultores brasileiros estão antecipando suas compras de fertilizantes. Aumento na demanda também acaba provocando especulações no mercado.
Entre as metas desse plano nacional está um desafio: reduzir a importação de 85% para 45%, mesmo que o país dobre a demanda por fertilizantes. Ademais, estão previstas 80 metas a serem atingidas, como, por exemplo, estimular o uso de técnicas inovadoras.
De acordo com o pesquisador da Embrapa Solos e especialista em Ciência do Solo, José Carlos Polidoro, devido a importância da agricultura brasileira, diminuir a dependência da importação de fertilizantes é uma questão de segurança nacional. Isso porque irá garantir segurança ao setor de produção de alimentos e do próprio agronegócio brasileiro.
Aumentar a eficiência no uso de fertilizantes
Reduzir a importação de fertilizantes da Rússia e de outros países é, sem dúvida, um desafio envolvendo toda a cadeia produtiva brasileira e, nesse primeiro momento, está envolvendo a área técnica. A Embrapa pretende realizar visitas aos principais polos agrícolas do país em busca de soluções a curto prazo.
Entre os objetivos estão: garantir uma maior eficiência dos fertilizantes aplicados nas lavouras, diminuir custos de produção, bem como estimular a adoção de novas tecnologias e de boas práticas de manejo de solo, água e plantas.
A proposta é conseguir uma redução de até 20% no uso desses insumos já na safra 2022/23. Essa medida pode resultar numa economia de até um US$ 1 bilhão ao agricultor brasileiro, bastando apenas o uso eficiente desses produtos.
Na crise, novas oportunidades. Conheça o pó de rocha
A crise dos fertilizantes, provocada nesse momento pela guerra entre Rússia e Ucrânia, abre espaço para a busca de alternativas que possam atender, com eficiência, o agronegócio brasileiro.
É o caso, por exemplo, do uso de produtos emergentes, como os fertilizantes organominerais (adubos orgânicos enriquecidos com minerais, por exemplo); e subprodutos com potencial de uso agrícola: bioinsumos e biomoléculas, remineralizadores (por exemplo, o pó de rocha), entre outros.
O uso do pó de rocha, por exemplo, pode contribuir na busca por alternativas visando substituir os fertilizantes.
Vamos abordar um pouco mais sobre uma dessas alternativas: o pó de rocha. Trata-se de um remineralizador, isto é, ajuda na recomposição dos minerais, melhorando as condições do solo com menor custo. A rocha é rica em micro e macro nutrientes e, assim sendo, misturados no solo alteram os índices de fertilidade.
Os resultados são: aumento do volume e tamanho das raízes; maior resistência às pragas e doenças (devido ao alto teor de silício); além de proporcionar um ambiente favorável ao crescimento e desenvolvimento de microrganismos que são fundamentais à uma agricultura sustentável.
Conclusão
Neste artigo, procuramos analisar os desdobramentos da guerra da Rússia em relação à exportação dos fertilizantes, que é motivo de tanta preocupação pelos agricultores brasileiros e de boa parte do mundo.
Como o Brasil é um dos maiores produtores mundiais de alimentos, não pode esperar que o sucesso dessa produção dependa justamente de fatores externos, como a importação desses fertilizantes.
Por isso, é preciso adotar medidas a curto, médio e longo prazo com o propósito de mudar esse panorama. O governo garante que está tomando medidas emergenciais.
Mas, cabe também ao agricultor fazer a sua parte: adotar manejos que possam contribuir com o uso mais eficiente desses produtos em suas lavouras, o que inclui evitar desperdícios. É uma forma, inclusive, de reduzir o custo de produção.
E então, esse artigo foi útil para você? Aproveite e acesse também o nosso post sobre os cuidados necessários na compra de fertilizantes. Boa leitura!
O post Fertilizantes: impactos da guerra da Rússia na agricultura brasileira apareceu primeiro em MF Magazine.