A cana-de-açúcar é uma das culturas mais importantes do Brasil, desempenhando um papel crucial na economia agrícola do país.
O Brasil destaca-se como o maior produtor mundial de cana-de-açúcar, alcançando uma produção superior a 654 milhões de toneladas na safra 2023/24. Essa safra é considerada a maior da história da cultura no país, marcando recordes tanto na moagem quanto na fabricação de etanol e açúcar.
Essa planta é a principal matéria-prima para a produção de açúcar e etanol. No entanto, a cana-de-açúcar está sujeita a várias doenças que podem comprometer a produtividade das lavouras, entre elas o raquitismo-das-soqueiras.
Nesse artigo, vamos falar um pouco mais sobre as características da cana-de-açúcar, relação de doenças com déficit hídrico e principais métodos de controle que podem ser utilizados para reduzir as perdas. Boa leitura!
Importância da cana-de-açúcar no Brasil
A cana-de-açúcar é cultivada em diversas regiões do Brasil, com destaque para os estados de São Paulo, Minas Gerais, Goiás, Paraná e Mato Grosso do Sul.
A cultura é vital para a economia do país, gerando empregos e movimentando a cadeia produtiva do setor sucroenergético.
Além disso, a produção de etanol a partir da cana-de-açúcar contribui para a matriz energética do Brasil, promovendo uma alternativa renovável e menos poluente aos combustíveis fósseis.
Morfologia da planta
A cana-de-açúcar (Saccharum spp.) é uma gramínea tropical que pode atingir alturas de até seis metros.
Sua estrutura é composta por nós e entrenós, sendo os entrenós responsáveis pelo armazenamento de sacarose.
Fases fenológicas da cana-de-açúcar Fonte: Nakano (2011)
A planta possui folhas longas e estreitas, que emergem dos nós, e raízes fibrosas que se estendem superficialmente no solo.
A colheita da cana é geralmente realizada quando a planta atinge a maturidade, que ocorre entre 12 a 18 meses após o plantio, ocorrendo entre os meses de abril e novembro na região Centro-Sul do país e de novembro a abril, na região Nordeste.
Principais doenças da cana-de-açúcar
A cana-de-açúcar pode ser acometida por mais de 200 patógenos causadores de doenças, como fungos, vírus, nematoides e bactérias, no entanto, no contexto nacional, o raquitismo das-soqueiras, é considerada uma das principais doenças que reduzem o potencial produtivo e a qualidade da cana colhida.
Perdas na produtividade
O raquitismo-das-soqueiras é uma doença causada pela bactéria Leifsonia xyli subsp. xyli e é uma das principais doenças que causam perdas significativas na produção de cana-de-açúcar, chegando a reduzir a produtividade em até 30%, infectando 100% do canavial, o que pode representar prejuízos financeiros consideráveis a curto, médio e longo prazo.
Em variedades suscetíveis, as perdas podem chegar a 50%.
Sintomas principais do raquitismo-das-soqueiras:
Crescimento reduzido: as plantas infectadas têm um desenvolvimento mais lento e apresentam soqueiras raquíticas;
Internódios curtos: os entrenós, que são os espaços entre os nós do caule, ficam visivelmente mais curtos e vermelhidão no feixe vascular do colmo. A severidade da doença aumenta com o crescimento da bactéria na planta;
Folhas cloróticas: as folhas das plantas doentes podem ficar amareladas;
Menor produção de colmos: a produção de colmos, que são os caules da cana, é bastante reduzida, afetando a produtividade da lavoura.
Sintomas característicos do raquitismo-das-soqueiras da cana-de-açúcar. Fonte: Gerhard Waller – ESALQ/DvComun, 2019. Além dos sintomas que podem ou não serem observados, a doença causa ainda um desbalanço hormonal, aumentando os níveis de ácido abscísico (ABA) e reduzindo os níveis de auxina e giberelina no colmo.
Déficit hídrico e raquitismo-das-soqueiras
Leifsonia xyli subsp. xyli é uma bactéria gram-positiva que coloniza o lúmen dos feixes vasculares do xilema, podendo se espalhar para o mesofilo e bainha das folhas. Seu genoma possui poucos genes de patogenicidade e carece de enzimas para a biossíntese de aminoácidos, tornando sua sobrevivência dependente da planta hospedeira.
A severidade da doença está diretamente ligada ao título bacteriano, manifestando sintomas quando a planta alcança altos níveis da bactéria, o que provoca alterações fisiológicas e afeta seu desenvolvimento.
Os sintomas da doença envolvem um desbalanceamento hormonal. As plantas doentes produzem mais ácido abscísico (ABA) e menos auxina e giberelina no colmo, em comparação com plantas saudáveis. Esse aumento de ABA pode ser devido à reação da planta ao estresse causado pela bactéria ou à falta de água.
A bactéria pode obstruir os vasos do xilema, levando a planta a produzir compostos de defesa. Esses bloqueios podem piorar a situação em períodos de seca, tornando os sintomas mais evidentes. No entanto, a presença da bactéria não necessariamente reduz a quantidade de água na planta, ou seja, não estão associados apenas ao déficit hídrico. A colonização da bactéria na planta não reduz o teor relativo de água.
Porém, o crescimento da bactéria no interior dos vasos condutores, altera o desenvolvimento da cana-de-açúcar, afetando o particionamento de carbono, resultando em acúmulo precoce de açúcares devido à menor formação de perfilhos (brotos) na planta.
Além disso, há impactos nutricionais causados pela infecção bacteriana nas plantas. O aumento da bactéria na planta causa um aumento na demanda de enxofre (S), e a absorção desse nutriente compete com a absorção de molibdênio (Mo).
Isso pode levar a uma deficiência de molibdênio, essencial para o desenvolvimento saudável da planta. Observou-se ainda que o aumento de S na planta com crescimento bacteriano reduziu a absorção e transporte de molibdênio, influenciando na redução da produtividade da cultura.
Identificação da Doença
Para identificar o raquitismo-das-soqueiras, é importante realizar inspeções regulares na lavoura.
Além dos sintomas visuais, como crescimento reduzido e internódios curtos, a confirmação da doença pode ser feita através de análise laboratorial.
A coleta de amostras de tecido vegetal para exames específicos pode detectar a presença da bactéria causadora da doença e é importante, especialmente em mudas de renovação do canavial.
Vale destacar que a doença é um dos maiores problemas dos canaviais. Primeiro por ter um controle difícil, tendo em vista que é causada por uma bactéria e que não possui controle químico. Segundo por causar reduções de produtividade dos canaviais e em muitos casos não apresentar sintomas evidentes ou característicos, sendo portanto, uma doença silenciosa e que pode passar invisível aos olhos humanos.
Técnicas para controle do raquitismo-das-soqueiras
Para controlar a doença na cana-de-açúcar, é essencial impedir a entrada da bactéria no talhão, pois ela não é transmitida por insetos, não sobrevive no solo e só afeta a cana. Assim, a doença só pode ser introduzida através de materiais de plantio contaminados.
Embora as mudas pré-brotadas estejam se tornando mais populares, o uso de materiais próprios ainda é comum. Nesse caso, é recomendável realizar análises laboratoriais de sanidade para garantir que os materiais de plantio estejam livres da bactéria antes de usá-los na reforma do canavial.
O controle do raquitismo-das-soqueiras é complexo e envolve uma combinação de práticas, principalmente de controle cultural e físico, incluindo desde o uso primordial de mudas sadias, a desinfecção de lâminas de corte com amônia quaternária e o tratamento térmico dos toletes de cana.
1. Uso de variedades resistentes
A escolha de variedades de cana-de-açúcar resistentes e ou tolerantes ao raquitismo-das-soqueiras é uma estratégia fundamental. Consultar instituições de pesquisa agrícola, como a Embrapa, pode ajudar a identificar as melhores variedades para cada região e de acordo com as necessidades de área de cultivo.
2. Uso de material propagativo sadio
A aquisição de mudas sadias e de procedência confiável é fundamental para evitar a entrada e a disseminação da doença na área de cultivo.
Algumas variedades de cana-de-açúcar são tolerantes e podem não apresentar sintomas, mas ainda assim podem propagar a doença se plantadas em áreas já contaminadas. Portanto, é essencial garantir que as mudas estejam livres de patógenos antes de iniciar o plantio.
Tratamento térmico de toletes de cana-de-açúcar, em água a temperatura de 50ºC, durante duas horas para eliminação da bactéria causadora do raquitismo-da-soqueira. Fonte: Yohann et al., 2017.
Conclusão
O raquitismo-das-soqueiras é uma doença séria que pode comprometer significativamente a produtividade das lavouras de cana-de-açúcar. No entanto, com o conhecimento adequado e a implementação de práticas de manejo eficazes, é possível controlar essa doença e garantir a sustentabilidade da produção.
Os produtores rurais devem estar atentos aos sintomas, realizar inspeções regulares e adotar uma abordagem integrada para o manejo do raquitismo-das-soqueiras.
A cana-de-açúcar continuará sendo uma cultura vital para o Brasil, e proteger essa planta das doenças é essencial para manter a competitividade do setor sucroenergético.
Adotar práticas de controle, principalmente preventivo, mantendo-se atualizado sobre as últimas pesquisas e desenvolvimentos no manejo de doenças é essencial para o sucesso e a sustentabilidade da produção de cana-de-açúcar no Brasil.
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