Um dos temas mais debatidos no mundo atualmente é a sustentabilidade, ou seja, como fazer a exploração de recursos naturais sem causar a degradação do meio ambiente. Com o crescimento demográfico e da atividade humana, aumenta-se cada vez mais a necessidade de ferramentas e meios de garantir a preservação ambiental ante pressões externas e evitar consequências a médio e longo prazo.
Com base nisso, o legislador concedeu proteção especial às Áreas de Preservação Permanente (APP), visando salvaguardar o meio ambiente e os recursos naturais existentes dentro de propriedades rurais e urbanas.
Neste artigo serão abordados os principais aspectos da APP, incluindo a sua caracterização, quem deve repará-las, bem como as diferenças em relação a outras classificações. Confira!
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O que são Áreas de Preservação Permanente (APP)?
As áreas de preservação permanente são aquelas que, em regra, não admitem a intervenção humana, pois devem ser protegidas de danos capazes de afetar as suas características naturais. São biomas característicos eleitos pela legislação ambiental para proteção e considerados de extrema importância para a higidez do meio ambiente, tendo sido tutelados de maneira mais rígida.
O conceito de área de preservação permanente está contido no artigo 3º, inciso II da Lei 12.651/2012, que atualmente disciplina o tema:
Art. 3º Para os efeitos desta Lei, entende-se por:
(…)
II – Área de Preservação Permanente – APP: área protegida, coberta ou não por vegetação nativa, com a função ambiental de preservar os recursos hídricos, a paisagem, a estabilidade geológica e a biodiversidade, facilitar o fluxo gênico de fauna e flora, proteger o solo e assegurar o bem-estar das populações humanas;
(…)
Assim, o estabelecimento das APP visa garantir a manutenção ambiental e o bem-estar das pessoas por meio da preservação dos seus atributos:
Biodiversidade;Estabilidade geológica;Recursos hídricos;Paisagem;Solo;Fauna e a flora.
As áreas de preservação permanente (APP) são aquelas que, em regra, não admitem intervenção humana devido às suas características naturais indispensáveis à higidez do meio ambiente.
Além da preservação em si, o artigo 7º da Lei 12.651/2012 também estabelece o dever de reparar quaisquer alterações desses espaços que sejam capazes de comprometer os atributos caracterizadores dessas áreas como objeto especial de proteção.
Desse modo, a reparação ocorrerá por meio da reversão das interferências negativas causadas na área, retornando ao status quo ante sempre que possível, ou seja, à situação em que se encontrava antes da degradação, ou então pela indenização quando os danos não puderem ser recuperados.
Quem deve reparar os danos ambientais em APP?
De acordo com a Lei 12.651/2012 e com a jurisprudência, a obrigação de reparar os danos ambientais em áreas de preservação permanente é considerada propter rem, ou seja, é uma obrigação que acompanha a posse ou domínio do bem, sendo irrelevante que o autor da degradação inicial não tenha sido o proprietário.
Art. 7º A vegetação situada em Área de Preservação Permanente deverá ser mantida pelo proprietário da área, possuidor ou ocupante a qualquer título, pessoa física ou jurídica, de direito público ou privado.
§ 1º Tendo ocorrido supressão de vegetação situada em Área de Preservação Permanente, o proprietário da área, possuidor ou ocupante a qualquer título é obrigado a promover a recomposição da vegetação, ressalvados os usos autorizados previstos nesta Lei.
§ 2º A obrigação prevista no § 1º tem natureza real e é transmitida ao sucessor no caso de transferência de domínio ou posse do imóvel rural. (grifos nossos)
(…)
Desse modo, a obrigação de reparar os danos ambientais feitos em APP é do proprietário atual da propriedade, sendo inclusive transmitida aos sucessores quando a posse ou domínio do bem é transferido.
Portanto, são três as obrigações instauradas pelas áreas de preservação permanente aos proprietários e/ou possuidores de propriedade imobiliária territorial:
Obrigação de não fazer: são as proibições de desenvolvimento, implantação e operação de atividades, bem como a instalação de empreendimentos e equipamentos nessas áreas;Obrigação de reparar: é a obrigação de recuperar ou compensar os atributos ambientais que eventualmente tenham sido alterados ilicitamente ou irregularmente, sem a autorização de autoridades competentes ou fora das hipóteses legais de interferência;Obrigação de tolerar a fiscalização da área: também é dever dos proprietários/possuidores tolerar que sejam feitas as devidas fiscalizações nessas áreas, bem como a execução de medidas de recuperação por terceiro.
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Áreas de Preservação Permanente X Unidades de Conservação
Tanto as Áreas de Preservação Permanente quanto as Unidades de Conservação apresentam o mesmo objetivo, ou seja, conferir a todos um meio ambiente ecologicamente equilibrado, conforme consta no artigo 225 da Constituição Federal:
Art. 225. Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações. (grifo nosso)
No entanto, enquanto as Unidades de Conservação admitem o uso sustentável (unidades de uso sustentável) ou indireto das áreas preservadas (unidades de proteção integral), as áreas de preservação permanente, em regra, são áreas intocáveis.
Dessa forma, a conservação ambiental, de maneira geral, refere-se à políticas e ações que visam proteger o meio ambiente por meio da exploração consciente de seus recursos, e a preservação ambiental objetiva preservar o meio ambiente de forma integral da ação humana.
Áreas de Preservação Permanente X Reserva Legal
A Reserva Legal está prevista nos artigos 12 e seguintes da Lei 12.651/2012 e refere-se ao percentual de espaço que deve ser mantido com cobertura vegetal nativa em imóveis rurais. Esses espaços correspondem às áreas consideradas necessárias à conservação da biodiversidade, fauna e flora nativa, devendo ser preservadas pelo proprietário/possuidor da propriedade rural.
Experimento de restauração de reserva legal com plantio de mudas na Embrapa Agrossilvipastoril. Foto: Gabriel Rezende Faria.
Art. 12. Todo imóvel rural deve manter área com cobertura de vegetação nativa, a título de Reserva Legal, sem prejuízo da aplicação das normas sobre as Áreas de Preservação Permanente, observados os seguintes percentuais mínimos em relação à área do imóvel, excetuados os casos previstos no art. 68 desta Lei:
I – localizado na Amazônia Legal:
a) 80% (oitenta por cento), no imóvel situado em área de florestas;
b) 35% (trinta e cinco por cento), no imóvel situado em área de cerrado;
c) 20% (vinte por cento), no imóvel situado em área de campos gerais;
II – localizado nas demais regiões do País: 20% (vinte por cento)
(…)
Conforme estabelecido pelo artigo 12, com a exceção da Amazônia Legal que apresenta percentuais específicos de reserva legal, para todas as demais regiões do país, a reserva legal corresponde, em geral, a 20% do imóvel rural. As áreas de reserva legal podem ou não contemplar áreas de preservação permanente no seu interior, sendo essa possibilidade expressamente abordada no artigo 15 da Lei.
O que é considerado APP?
A classificação das Áreas de Preservação Permanente consta na Lei 12.651/2012, que prevê no artigo 4º as hipóteses legais e no artigo 6º as hipóteses decorrentes de ato administrativo.
As áreas de preservação permanente decorrentes de lei (artigo 4º) são taxativas e têm eficácia imediata, ou seja, não precisam de qualquer outro instrumento para que sejam aplicadas (autoaplicabilidade). Já aquelas decorrentes de ato administrativo (artigo 6º) dependem de declaração específica de interesse social por ato do Chefe do Poder Executivo, por meio de um decreto.
Além disso, essas previsões são abertas, não estabelecendo ambientes ou ecossistemas específicos para proteção, o que autoriza o Poder Executivo a definir as áreas de preservação permanente, desde que satisfeito um único requisito essencial: a área protegida seja voltada à realização de uma das finalidades constantes nos nove incisos do artigo 6º.
Portanto, o estabelecimento de áreas de preservação permanente pelo Poder Executivo não é uma obrigação e sim uma discricionaridade, devendo verificar no caso concreto a sua relevância ao interesse público, bem como atender as finalidades dispostas na lei.
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Áreas de Preservação Permanente decorrentes de lei
Antes de tratar das hipóteses propriamente ditas, é importante destacar que o caput do artigo 4º da Lei 12.651/2012 prevê de forma inequívoca que o estabelecimento de áreas de preservação permanente e os seus limites são aplicáveis tanto para áreas rurais quanto urbanas:
Art. 4º Considera-se Área de Preservação Permanente, em zonas rurais ou urbanas, para os efeitos desta Lei:
(…)
Vejamos quais são as áreas de preservação permanentes estabelecidas pela lei.
Faixas marginais de cursos d’água
São áreas de preservação permanente as faixas marginais de cursos d’água – natural, perene ou intermitente – medidas a partir da borda da calha do leito regular, seja ela coberta ou não por vegetação nativa ou floresta. O dispositivo exclui de sua aplicação os cursos d’água artificiais (feitos pelo homem), os efêmeros (com escoamento apenas durante as grandes precipitações), bem como aquelas que escoam águas de origem pluvial.
A borda da calha do leito é o exato limite do canal onde é escoada a água regularmente durante o ano, ou seja, é considerado o nível em que a água corre regularmente durante o ano, inclusive no período de seca. Portanto, o leito regular pode depender do monitoramento do curso da água durante períodos de cheia e baixa do volume das águas.
Dessa forma, a Lei prescreve distanciamentos de áreas de preservação permanente diferenciados de acordo com a largura do curso d’água:
Considerando que os cursos d’água podem apresentar largura variável em sua extensão, a APP da faixa marginal do curso d’água acompanhará a variação da largura do curso d’água de acordo com a sua distribuição espacial.
As faixas marginais de cursos d’água são áreas de preservação permanente, sendo que a metragem será definida de acordo com a largura do curso regular. Foto: José Felipe Ribeiro.
Entorno dos lagos e lagoas naturais
A Lei caracteriza como área de preservação permanente o entorno dos lagos e lagoas naturais, partindo da premissa de que possuem formato preponderantemente circular. Essa acumulação hídrica deve ser natural, ou seja, proveniente de nascentes, cursos d’água naturais ou da contribuição do mar, sem intervenção antrópica.
Detalhe importante é que a Lei dispensa a reserva da faixa de preservação permanente para acumulações de água com superfície menor que 1 hectare, vedando, todavia, novas supressões de vegetação nativa no entorno.
Os distanciamentos estabelecidos pela lei para as APP no entorno dos lagos e lagoas variam de acordo com a sua localização – urbana ou rural – e com a dimensão do corpo hídrico nas zonas rurais:
Diferentemente do curso d’água, os lagos e lagoas não apresentam variação de dimensão, sendo uniformes assim como a APP ao seu entorno. O distanciamento deve ser medido perpendicularmente, com ângulo reto, do limite do corpo hídrico (limite entre água e terra).
Entorno de reservatórios de águas artificiais
A APP estabelecida no entorno de reservatórios de águas artificiais diz respeito aos reservatórios decorrentes de barramento ou represamento de cursos d’água naturais. Desse modo, a lei exclui da aplicação os reservatórios artificiais formados a partir do represamento de cursos artificiais, bem como de acumulações pluviais.
Os limites das áreas de preservação permanente no entorno dos reservatórios de águas artificiais, nos casos de geração de energia ou abastecimento público, levam em conta o local (urbano ou rural), com limites mínimo e máximo:
Entorno de nascentes e olhos d’água
São consideradas áreas de preservação permanente o entorno de olhos d’água naturais e nascentes naturais perenes, ou seja, que afloram água permanentemente, independentemente da época do ano e das precipitações.
Apesar da legislação prever que apenas as nascentes e olhos d’água perenes devem contar com APP no seu entorno, a doutrina e a jurisprudência já pacificaram o entendimento a respeito do tema, sendo aplicável também às intermitentes. O importante é que a sua origem seja natural e não artificial.
A faixa de preservação permanente nesses casos é de, no mínimo, um raio de 50 metros.
Encostas
As encostas são qualificadas como áreas de preservação permanente e correspondem às partes inclinadas de uma elevação de terreno. A lei estabelece que a declividade das encostas deve ser superior a 45º (ângulo de inclinação) ou equivalente a 100% (a cada 100 metros de deslocamento horizontal há elevação vertical de 100 metros), na linha de maior declive.
Em outras palavras, será considerada APP a exata extensão do terreno em que a declividade for mais acentuada, ou seja, superior 45º ou equivalente a 100%.
As encostas, de acordo com a norma, são consideradas APP na exata extensão em que a declividade for mais acentuada. Foto: Felipe Ribeiro.
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Restingas
São requisitos para que a restinga seja qualificada como área de preservação permanente:
Solo: depósito arenoso;Com a presença de comunidades específicas: que recebem influência marinha;Cobertura vegetal específica: em mosaico, com estratos herbáceos, arbústicos e arbóreos;Exercício de funções ambientais: fixar dunas ou estabilizar mangues.
A ausência de quaisquer desses elementos desqualifica a área como de preservação permanente para efeitos legais.
As restingas, para serem consideradas APP, devem seguir os requisitos elencados pela lei. Foto: Ladislau Skorupa.
Manguezais
De acordo com a Lei 12.651/2012, manguezal consiste no ecossistema que é composto pelos seguintes elementos:
Terrenos baixos sujeitos à ação de marés, formados por vasas lodosas recentes ou arenosas;Com associação predominante de vegetação natural conhecida como mangue;Com influência fluviomarinha;Típica de solos limosos de regiões estaurinas.
Importante destacar que o mangue é a vegetação natural e o manguezal é o ecossistema, sendo apenas o último considerado área de preservação permanente quando identificados todos os seus elementos de composição.
Trata-se, portanto, de um ambiente de transição entre mar e terra que se desenvolve, geralmente, na foz dos cursos d’água junto ao mar. Para a sua caracterização como área de preservação permanente é preciso que ocorram concomitantemente: a influência da maré, o mangue como vegetação predominantemente natural e o solo limoso (decorrente da ação das marés, material orgânico em decomposição e contribuição fluvial) de terrenos baixos.
A ausência de qualquer um desses elementos não permite a caracterização legal do manguezal, bem como a sua qualificação como área de preservação permanente.
Os manguezais são ecossistemas enquadrados como áreas de preservação permanente desde que preenchidos os elementos caracterizadores previstos em lei.
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Marismas
As marismas são áreas úmidas sujeitas à inundação pela maré, com solo de alta salinidade (entre 100 e 150 partes por 1.000), onde pode ocorrer desenvolvimento de vegetação herbácea específica. Tratam-se de ecossistemas adjacentes aos manguezais, mas com eles não se confundem, já que a Lei 12.651/2012 outorga tratamento distinto a ambos os ecossistemas.
Bordas de tabuleiros ou chapadas
Tabuleiros ou chapadas são formas específicas de relevo, com topografia plana, sendo em geral limitadas por escarpas. Os tabuleiros apresentam altitudes relativamente baixas, enquanto as chapadas situam-se em altitudes mais elevadas.
A Lei dispõe que as áreas de preservação permanente não correspondem a todo o relevo do tabuleiro ou da chapada, mas sim à faixa horizontal de 100 metros medidos a partir de sua borda.
Os 100 metros horizontais contados a partir da borda dos tabuleiros ou chapadas são considerados área de preservação permanente. Foto: Maria Cristina Oliveira.
Topo de morros
É considerada área de preservação permanente o terço final da elevação do morro, monte, montanha ou serra que tenha altura mínima de 100 metros e inclinação média maior que 25º, sendo estes requisitos cumulativos. Dessa forma:
O marco utilizado para a medição da altura da elevação e do terço final da curva de nível é sempre a base do morro. Caso esteja localizado próximo à uma planície ou espelho d’água, estas serão consideradas como marco inicial.
Já em áreas de relevos ondulados, é a cota do ponto de sela que será utilizada como referencial de base. Ponto de sela é o ponto de uma superfície no qual a declividade é nula, e está ao lado do máximo local (cume da elevação) e mínimo local (fundo de cavidade).
Áreas com altitude superior a 1.800 metros
As áreas com altitude superior a 1.800 metros, qualquer que seja a vegetação, são consideradas áreas de preservação permanente. O objetivo da Lei é conferir proteção à fauna e flora desses locais, já que apresentam riqueza de espécies, tanto em escala local quanto regional.
Faixa marginal de veredas
As veredas são conhecidas como savanas brasileiras e são áreas com tipo de formação vegetal característica de solos hidromórficos, ou seja, saturados por água de forma permanente. A área de preservação permanente corresponde à faixa marginal de, no mínimo, 50 metros das veredas, sendo a sua medição realizada horizontalmente a partir do espaço permanentemente brejoso e encharcado.
A faixa marginal (de 50 metros, mínimo) contada a partir do espaço permanentemente brejoso das veredas é considerada área de preservação permanente. Foto: Bruno M. T. Walter.
Exceções
Apesar das áreas de preservação permanente apresentarem regime jurídico altamente restritivo (em regra, não admitem a intervenção humana), o legislador mitiga a observância dessas restrições em algumas situações específicas:
Quando a ação humana a que se pretende empreender no local não é suficiente a ponto de comprometer atributos ambientais e ecológicos do espaço;Quando razões de utilidade pública e interesse social justifiquem o seu abrandamento.
E então, gostou desse conteúdo? Que tal complementar a leitura com o nosso artigo sobre agricultura regenerativa e suas práticas para restabelecer os recursos naturais nas áreas utilizadas para agricultura? Boa leitura!
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